AO VIVO E A CORES

abr 17, 2020

O encerramento das escolas, jardins-de-infância e creches levou a que as crianças do nosso país ficassem completamente isoladas dos seus pares, naturais agentes de socialização. Deixou-os também distantes do contacto presencial com professores, educadores, treinadores, familiares e outras forças sociais vivas que ajudam a formá-las como cidadãos. O incentivo ao uso massivo do digital (televisão, telemóveis, tablets, computadores) com todas as novidades tecnológicas tais como as plataformas Skype, Zoom, Google Classroom, tenta colmatar a falta real e inalienável do contacto proximal. O sucesso deste esforço é duvidoso e certamente assimétrico, sendo muito condicionado pelo acesso desigual aos meios digitais bem como à idade das crianças.

Quanto mais baixa é a faixa etária, mais difícil é promover aprendizagens intermediadas por máquinas. A capacidade de concentração, absorção de conteúdos e utilização de ferramentas digitais é diminuta; as crianças pequenas são eminentemente práticas e sensoriais, têm o pensamento e a acção intimamente relacionados – a capacidade de abstracção e o pensamento hipotético-dedutivo adquirem-se tardiamente.

Criança a brincar com a mãe de legos

Neste sentido, é essencial promover e estimular:

  • actividades lúdicas espontâneas (colectivas ou solitárias) onde a criatividade, imaginação, jogo simbólico (“faz-de-conta”) abundem;
  • jogos colectivos nos quais se aprenda a compreender e a respeitar as regras, a esperar pela vez, a lidar com as emoções de perder e ganhar, a criar resistência à frustração, a saber ser persistente;
  • jogos solitários, onde se aprende a ser paciente e esforçado, a não desistir, a saber estar concentrado, a saborear o “consegui acabar sozinho” (ou só com uma pequena ajuda…);
  • audição activa: ouvir histórias contadas sem suporte visual, lenga-lengas, cantigas, músicas – com as quais se desenvolve a atenção, a discriminação auditiva, a concentração, a linguagem;
  • “leitura” de livros (quer se saiba ou não ler): ler, folhear, observar, inventar, acompanhar a leitura (feita por um adulto) – onde o gosto pelos livros, pelo material escrito, pelas histórias, é incentivado; onde o conhecimento da língua é desenvolvido quer a nível da compreensão e apreensão da sua estrutura, quer do vocabulário; a imaginação, a criatividade, a gestão emocional, são capacitadas; a necessidade e vontade de comunicar aumenta e melhora;
  • brincadeiras “malucas”: lutas de almofadas, batalhas de cócegas, “o monstro vai-te apanhar”, entre outras – onde são promovidos momentos de descarga emocional saudável, de excitação partilhada, de gestão do medo e conflitos latentes, de salutares gargalhadas e alegria genuína. Fortalecem-se laços de proximidade física e emocional.

“AO VIVO E A CORES” tudo se torna mais real, mais presente e duradouro. Ajudemos as nossas crianças a não perderem a magia das “coisas vivas e a sério”.

Maria João Faria (psicóloga do CPBESA)